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segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Videoconferência

Em janeiro deste ano, foi publicada a lei que regula o uso da videoconferência como regra na hora de efetuar o interrogatório de um preso. Apenas em caso de exceção, o juiz se encaminharia à prisão, devidamente protegido para fazê-lo pessoalmente. A lei nem sequer completou um mês e já pende sobre ela a mancha da inconstitucionalidade.
O STJ já havia se posicionado sobre o uso dessa mídia, confira a ementa:

EMENTA: AÇÃO PENAL. Ato processual. Interrogatório. Realização mediante videoconferência. Inadmissibilidade. Forma singular não prevista no ordenamento jurídico. Ofensa a cláusulas do justo processo da lei (due process of law). Limitação ao exercício da ampla defesa, compreendidas a autodefesa e a defesa técnica. Insulto às regras ordinárias do local de realização dos atos processuais penais e às garantias constitucionais da igualdade e da publicidade. Falta, ademais, de citação do réu preso, apenas instado a comparecer à sala da cadeia pública, no dia do interrogatório. Forma do ato determinada sem motivação alguma. Nulidade processual caracterizada. HC concedido para renovação do processo desde o interrogatório, inclusive. Inteligência dos arts. 5º, LIV, LV, LVII, XXXVII e LIII, da CF, e 792, caput e § 2º, 403, 2ª parte, 185, caput e § 2º, 192, § único, 193, 188, todos do CPP. Enquanto modalidade de ato processual não prevista no ordenamento jurídico vigente, é absolutamente nulo o interrogatório penal realizado mediante videoconferência, sobretudo quando tal forma é determinada sem motivação alguma, nem citação do réu.

(HC 88914, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Segunda Turma, julgado em 14/08/2007, DJe-117 DIVULG 04-10-2007 PUBLIC 05-10-2007 DJ 05-10-2007 PP-00037 EMENT VOL-02292-02 PP-00393 RT v. 97, n. 868, 2008, p. 505-520)

A justificativa do autor da lei, ao meu ver é plausível, e a nova lei sanou alguns dos defeitos apontados na ementa supramencionada.

O projeto de lei em tela visa pôr fim ao chamado “turismo judiciário”, em que o preso precisa ser freqüentemente deslocado para o tribunal, ou próprio magistrado precisa se deslocar ao estabelecimento penal. A alteração feita pela Lei nº 10.792, de 2003, no art. 185 do Código de Processo Penal (CPP), que tornou a ida do magistrado ao presídio a regra no interrogatório judicial, não vem sendo aplicada na prática. Esta já era uma situação prevista quando da discussão do projeto no âmbito da Subcomissão de Segurança Pública do Senado Federal. É um contra-senso exigir que o magistrado se dirija ao estabelecimento penal num País em que os presídios são dominados e governados por organizações criminosas, como o CV e o PCC.

O fato é que os presos continuam sendo transportados para os tribunais. Na recente onda de violência em São Paulo, em que o PCC alvejou várias instituições públicas e privadas da capital, ações foram perpetradas justamente aproveitando-se do transporte de presos para interrogatório.

A disposição atual do CPP esconde manifesto risco contra a vida de nossos magistrados. Além disso, é uma afronta à administração da Justiça, pois o juiz deixa de julgar para tratar apenas de visitas a presos, pois, só no Estado de São Paulo, há 7.000 escoltas por semana! É imprescindível a adoção pelo nosso sistema judiciário da moderna técnica da videoconferência, solução simples e menos onerosa aos cofres públicos, e usada com sucesso por vários países do mundo.

Em São Paulo, a média de gasto com a escolta de um preso ao tribunal é de R$ 2.500,00. Com o sistema de videoconferência, estar-se-ia economizando algo em torno de R$ 17.500.000,00 por semana, se considerarmos um preso por escolta. Só no Distrito Federal, um dos estados brasileiros pioneiros nessa técnica, conforme declaração do juízo de execução penal, a economia está em torno de R$ 1 milhão por mês.

Outrossim, a nosso ver, o interrogatório no estabelecimento prisional fere o princípio da publicidade dos atos processuais. Enquanto o referido ato processual é praticado nas dependências do fórum, permite-se a qualquer do povo acesso à sala de audiências. Ao revés, realizado no interior de uma penitenciária, a publicidade inerente à atividade judiciária e insculpida como princípio constitucional (art. 5º, LX, da CF) fica limitada às partes.

Portanto, julgamos tratar-se de proposta de fundamental relevância para o aperfeiçoamento de nosso ordenamento jurídico penal.


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